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“A Sombra de Uma Dúvida”: Os 70 anos do favorito de Hitch

Foto: DivulgaçãoUma pequena cidade norte-americana abriga a família Newton. Típica residência do país no início da década de 40. Pai e mãe trabalhadores sustentam três filhos. Uma, Charlie, já adentrando a idade adulta. Seu nome, uma homenagem ao tio, irmão caçula de sua genitora. Eis que o mesmo, após longo período afastado dos familiares, resolve voltar para uma visita sem prazo para terminar. Sua chegada, de trem, é anunciada por uma densa fumaça negra que se espalha pelos céus do município de Santa Rosa. Sua partida, ao final do filme, pelo mesmo meio de transporte, é marcada por uma fina fumaça branca, que anuncia a paz. E nos 108 minutos que permeiam ambas viagens, a dúvida paira como o vapor gerado pelos vagões principais: tio Charlie é ou não é o famoso “assassino das viúvas alegres”?

Em 2013, “A Sombra de Uma Dúvida” (Shadow of a Doubt, 1943) completa 70 anos de produção e lançamento. Alfred Hitchcock levou ao túmulo a afirmativa de que esta é sua principal obra. O fato é que, mesmo não sendo considerado um longa que se assemelhe aos êxitos de “Um Corpo Que Cai” (Vertigo, 1959) e “Psicose” (Psycho, 1960), possui um dos melhores roteiros escritos para a magistral direção do Mestre do Suspense.

Foto: DivulgaçãoA aula de cinema vai além do trocadilho com “as fumaças” dos trens. O clima de tensão dura o mesmo tempo do filme. O antagonismo gerado por personagens homônimos, muito bem interpretados por Joseph Cotten e Teresa Wright (incluindo a audácia em colocar o mesmo nome em ambos, algo incomum para qualquer padrão cinematográfico). A fixação macabra de dois homens de bem por assassinato e morte (o patriarca dos Newton, Joseph, encarnado por Henry Travers e seu amigo, Herbie – Hume Cronyn), e o clima gerado por suas incessantes conversas sobre o melhor modo de matar alguém. O “estranho” fato de que a família permanece durante todo o longa cantarolando a “Valsa da Viúva Alegre”, composta pelo austro-húngaro Franz Lehár no início do século XX.

Canção entoada algumas vezes durante a película e mostrada em cenas com casais dançando-a em um baile de gala. O jogo de câmera inclui dezenas de sombras na imagem do soturno Charlie, enquanto a sobrinha recebe cenas claras e bem iluminadas. Dificilmente se vê alguma cena com Joseph Cotten em que a câmera esteja nivelada a seu rosto. A fotografia o mostra quase sempre de baixo para cima, dando óbvios sinais de que ali está um homem que se impõe. As perguntas: perante quem e de qual forma?

Na visão de muitos, “A Sombra de Uma Dúvida” não atinge o patamar daqueles considerados como filmes de “primeiro escalão” de Hitch. Opinião partilhada por este blogueiro pelos simples fato de o cineasta ter conseguido o ápice com obras de melhor qualidade. Porém, nele estão contidas características típicas do cinema hitchcockiano: clímax filmado com cortes rápidos, humor negro em grandes doses e muita apuração no posicionamento de seus quadros. Portanto, jamais deve-se olhar para este filme com preconceito. Mas com a certeza de que a grande dúvida jaz na questão central de sua trama, e nunca no nível de sua produção (em todos os seus aspectos e fases).

Especificações técnicas
Filme: “A Sombra de Uma Dúvida”
Nome original: “Shadow of a Doubt”
País e ano: EUA/ 1943
Produtoras: Universal Pictures e Skirball Productions
Duração: 108 min
Fotografia: Preto e Branco
Gênero: Suspense
Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Thornton Wilder, Sally Benson e Alma Reville (baseados em estória de Gordon McDonell)
Produção: Jack H. Skirball
Música: Dimitri Tiomkin
Elenco: Teresa Wright (Young Charlie – Charlie Newton), Joseph Cotten (Uncle Charlie – Charles “Charlie” Oakley), MacDonald Carey (Jack Graham), Henry Travers (Joseph Newton), Patricia Collinge (Emma Newton), Hume Cronyn (Herbie Hawkins), Wallace Ford (Detective Fred Saunders), Edna May Wonacott (Ann Newton), Charles Bates (Roger Newton), Irving Bacon (Station Master), Clarence Muse (Pullman Porter), Janet Shaw (Louise Finch), Estelle Jewel (Catherine).